O que é Química Computacional?
O século XXI começou com a chamada “dotcom bubble” (bolha ponto-com, em alegoria aos endereços eletrônicos), uma supervalorização de empresas de tecnologia da informação que trabalhavam com vendas na internet. A primeira grade crise econômica do século quando essa bolha estourou em 2001. Razões econômicas à parte, o que se via era o presságio que computadores se tornariam uma parte importante do novo século. Nas ciências exatas, o uso da computação já era um processo em andamento: computadores são ótimos realizadores de tarefas repetitivas e podem ser programados para serem excelentes calculadoras numéricas.
A época entre o final dos anos 1970 e os anos 2000 viu todo o arcabouço teórico criado no início do século XX — a mecânica quântica, a mecânica estatística de fluidos etc — sendo implementado em programas que previam propriedades físico-químicas com certa precisão. Assim nasceu a Química Computacional a partir da Física Atômica e Molecular e da Física de Matéria Condensada. Hoje, com o avanço da automação no mercado de trabalho, com a necessidade de tratar os recursos físicos com maior cuidado e com a limitação dos orçamentos de pesquisa, o seu papel se tornou ainda mais central.
Ao se falar em Química Computacional, tradicionalmente se pensa em cálculos de estrutura eletrônica, em mecânica molecular, em dinâmica molecular e em químioinformática. Cálculos de estrutura eletrônica são métodos baseados em aproximações da famosa equação de Schrödinger para espécies químicas multieletrônicas e têm o maior poder preditivo de todas as técnicas. Infelizmente, entretanto, são técnicas muito custosas: o cálculo da energia de uma molécula é um processo iterativo que pode demorar até convergir.
Se quisermos uma amostragem de diversas configurações moleculares, cálculos de estrutura eletrônica não são computacionalmente eficientes e usamos a mecânica molecular, onde a energia da molécula é descrita por uma função (campo de forças) parametrizada de acordo com cálculos quânticos e grandezas experimentais. Uma das aplicações mais comuns é no estudo do ancoramento (docking) entre uma proteína e um ligante: tanto a proteína quanto os candidatos a ligantes são representados por campos de força para descobrir a melhor energia de interação.
Muitas das propriedades físicas de interesse são médias de seus valores calculados para inúmeras configurações microscópicas. Para calculá-las, usamos a dinâmica molecular, onde a evolução temporal de átomos e moléculas é simulada de acordo com as leis de Newton. Outra forma de explorar as diversas configurações microscópicas é o método de Monte Carlo, onde átomos e moléculas são aleatoriamente mudados de posição e a nova configuração pode ou não ser aceita de acordo com critérios definidos por quem planejou o experimento.
Ainda assim, quando se lida com centenas de milhares ou milhões de moléculas às vezes compensa usar métodos ainda mais simples. A químioinformática cumpre esse papel criando a possibilidade de predizer propriedades físico-químicas de determinadas substâncias a partir de propriedades moleculares diversas, sejam elas estruturais ou não.
Hoje, entretanto, a Química Computacional está em expansão por conta do momentum ao redor da inteligência artificial, da automação de processos e do planejamento de experimentos. Tradicionalmente associada à Físico-Química, a Química Computacional hoje se expande para outras áreas e eu me arrisco a dizer que químico nenhum deveria sair da universidade sem saber o mínimo de programação e sem conhecer um pouco das técnicas básicas de Química Computacional. Por conta disso, eu farei um exercício de futurologia a respeito do que vem por aí e escreverei um artigo a respeito nas próximas semanas. Não deixem de acompanhar!